"Quando ela não estava, ele perguntava-se onde é que ela estava. Quando ela estava e fazia de conta que só existia ele no mundo, tudo parecia melhor. Mas agora já não está de todo. E no entanto, ele lembra-se dela a propósito de tudo, todos os dias, recorda os seus olhos, o seu toque, o cheiro da sua pele, o cabelo. Lembra-se da sua voz e do modo como se ri. [...]
Ela é daquelas pessoas a que não é fácil de se chegar a princípio, cujo afecto só se pode conquistar aos poucos. [...] A certa altura, recorda-se bem, tivera a certeza de que iriam ficar juntos e ser felizes. [...]
Pergunta-se se ela será feliz agora, se lhe chega o que tem, se se conforma com o que não tem. Imagina que não, ou prefere acreditar que não.
[...] dirige-se para o quarto a pensar que perdeu mais um dia sem ela, que perderam mais um dia separados. Deita-se, apaga a luz, fica mergulhado na escuridão de olhos abertos e, como sempre, antes de adormecer, decide que amanhã vai telefonar-lhe. Mas no dia seguinte, como sempre, pensará que não vale a pena, pois é tarde demais para eles. E não chegará a fazê-lo."
por Tiago Rebelo, in "Domingo"
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